sábado, 25 de outubro de 2014

CHICLETES GORILA UM SABOR DE AMIZADE HISTÓRIA_6


Olá, quem não se lembra das pastilhas elásticas Gorila!

Eu aproveitava todos os trocos e gorjas, que tinha como recompensa dos recados que fazia a algumas velhotas, da minha aldeia, Para comprar as chiclas da Gorila.
Era dois em um. Já que além da pastilha, ela fazia-se acompanhar de um cromo para juntar a nossa coleção.
Este investimento saciava dois desejos.
Sempre que ia a loja do Sr., António com algumas moedas a reluzirem na minha mão, ele já sabia.

Quantas são Diogo?

Deixava-as cair no balcão e juntos conferia-mos, para ver quantas dava.
Por vezes até faltavam uns testões, mas o Sr. António que não era somítico, acabava por me presentear com mais uma.
Aquela atitude era como me fidelizar-me a sua loja.
Tinha uma figura pitoresca, de estatura média, magro e com um longo e farfalhudo bigode, semblante sorridente e sempre por companhia o seu lápis por de traz da orelha.
Sentia que gostava de mim, só não achava muita piada a algumas das traquinices que por vezes fazia em conjunto com os outros.
Ainda recordo a célebre frase que as pessoas mais velhas da minha aldeia diziam. 

 Raios parta a canalha,
Nem o diabo quis conversa com ela. 

 Eu não achava piada a frase porque se o diabo é tão mau,
Então estavam a dizer que nós ainda eramos piores.
Mas ao mesmo tempo também lhe dava outra interpretação.
Se nós conseguíamos ser piores que o diabo, que é mau, ainda somos mais fortes, era-mos uns heróis!
Com as Gorilas no bolso eu era um rei.
Os meus amigos acercavam-se de mim na ânsia que eu lhes oferecesse uma chicla.
O Daniel o Rafa o Rodrigo o André quase que em uníssono uns com voz mais audível outros mais tímida, pediam-me. 

 Ó, Diogo podias dar-me uma chicla.
Dás-me Diogo? Anda lá! 

 Eu acedia ao pedido, mas com uma condição.
O cromo, é meu.
A quem eu oferecia em primeiro, era ao Rodrigo, pelos laços familiares que nos une.
É afilhado dos meus Pais.
Agregado a isso, era o mais tímido e nem pedia.
E como fui educado a não pedir nada aos meus pais, sabendo eu que dessa forma lhes despertava uma maior vontade de me presentear,
Achava a postura do Ródri, era assim que o tratava, a mais correta.
Era como um irmão que eu não tinha.
Por vezes até nem lhe dava na frente dos outros, para eles não repararem na minha dualidade de critérios.
Mas o Rodrigo sabia que eu tinha sempre a pastilha para ele, com a vantagem, dava-lhe o cromo se ele já fosse repetido.
Lembro uma vez, que fui chamado a pressa pela minha mãe.
Corri para casa e acabei por me esquecer de dar a chicla ao Rodrigo.
Durante o jantar, assaltou-me à ideia o meu esquecimento.
Mergulhei numa grande tristeza pela minha falha.
Arranjei uma boa mentira, para os meus Pais me deixarem ir a casa dele, com o pretexto de um trabalho de turma, que estava-mos a fazer na escola, mas que tinha-mos de dar continuidade em casa.
A minha Mãe disse-me logo que não, faltava o veredito final do meu Pai.

 Vais, mas quero-te aqui em casa dentro de 15 minutos. 

 Respirei de alívio, era tempo mais que suficiente para dar uma fugida a casa do Ródri, e emendar o meu erro.
Saí porta fora a correr.
Toquei a campainha.
Vinha lá de dentro um turbilhão de vozes alteradas, com linguagem vernácula.
Era mais um episódio de discussão, que infelizmente marcavam e traumatizavam a vida do Rodri.
Fiquei algo assustado.
O Pai do Ródri não ia lá muito com a minha cara, porque eu era muito frontal e rebatia as ideias ditatoriais dele.
Bom, eis que alguém abre a porta, estava algo receoso, mas era o Rodrigo. 

 O que queres Diogo? 

 Senti que estava magoado comigo.
Pedi-lhe desculpa e estiquei-lhe a mão e entreguei-lhe a gorila.
Instantaneamente o semblante carregado, deu lugar a uns olhos rasos de lágrimas.
Agradeceu-me com a voz trémula. 

Não tinhas necessidade de vires cá.
Muito obrigado, és um grande amigo Diogo.
Nunca tive dúvidas disso.
A, e desculpa a maneira como te falei quando te abri a porta.
Como já deves ter dado conta as coisas aqui por casa não estão fáceis. 

 Sim, já deu para ver.
Um dia, vais ter tudo que mereces.
Se a gorila ajudar a ficares um pouco mais feliz, já fico contente. 

 Não, Diogo. A chicla não me vai por feliz.
Mas o teu gesto a tua atitude, essa sim encheu o meu coração de felicidade.

 Ainda bem Rodrigo.
Boa noite. 

 Mais uma vez obrigado Diogo és um amigão.
Amanhã dou-te o cromo. 

 Não, é para ti. 

 E se te faltar? 

 Ródri, não é um cromo que paga a felicidade de um amigo.
Tchau, fica bem.
Corri para casa, já que o tempo que me tinha sido concedido, estava-se a esgotar.
Chegado encontrei o meu pai a ler, e a minha mãe a preparar as roupas para o dia seguinte.
Olharam-me e a minha mãe, fez o comentário. 

 Então Diogo o trabalho, já tiraste as dúvidas com o Rodrigo? 

 Sim mãe, já. 

 Diogo, sabes que nós não gostamos que tu mintas, e os teus olhos facilmente te denunciam. 

 O que foste lá fazer Diogo? 

 Questionou-me o meu Pai, com voz firme.
Senti-me confrangido.
Não tinha medo aos meus Pais, nunca foram esses os padrões de educação que me ministraram.
Respeito sim, medo não.
Eu sabia que era quase impossível enganar, e muito menos mentir a minha Mãe.
Fiquei imóvel e em silêncio, durante uns segundos.
Lá respondi:
Sim, eu efetivamente menti.
Não há trabalho nenhum, eu fui dar ao Rodrigo uma pastilha elástica que lhe tinha prometido hoje a tarde.
Já que não o fiz, quando estava junto dele, porque vim a correr a quando da chamada da Mãe. 

 Sim, Diogo e porque não disseste a verdade? 

 Retorquiu-me o meu Pai.
Tive receio que por ser algo tão banal vocês não me deixassem ir.
Gosto de cumprir com a minha palavra e com as minhas promessas.
O Rodrigo, é um caso duplamente especial, já que como vocês sabem é o meu melhor amigo, além dos laços familiares que nos liga, nunca me pede nada, e tem a conjuntura familiar que infelizmente todos sabemos.
Daí este meu empenho em nunca falhar com ele, porque sei que o magou-o, e dessa forma estou, a contribuir para a sua tristeza e para o seu sofrimento.
Mas reconheço o meu erro em vos ter mentido.
Só me resta pedir-vos desculpa.
As lágrimas, lavavam-me a cara.
De pé, encostado a parede, olhava os meus Pais, com o respeito que me merecem.
Sentia-me um ator, só e abandonado no palco.
Eis que uma mão me puxa para um colo que bem conhecia.
O mais terno e doce colo do mundo. O da minha mãe.
Abraçou-me contra ela, limpou-me as lágrimas com a ponta do avental, e cobriu-me de beijos.
O meu Pai desviava o olhar para a televisão para eu não me aperceber de alguma lágrima atrevida que lhe escapasse, mas eu bem que o conhecia.
Ele era o meu Pai, mas acima de tudo o meu melhor amigo.
Sei do coração de ouro que tem e do orgulho, que sente por mim.
Eu amo os meus Pais.
Depois de todo o afago da minha Mãe, levantei-me e fui pedir desculpa ao meu Pai.
Ele fitou-me fixamente, com um olhar ternurento, disse-me.
 
 Diogo, sabes que não gostamos de mentiras, mas o teu ato foi tão nobre, em honrares a tua palavra, com o intuito de Acarinhares o teu melhor amigo, que só por si a falha para connosco está perdoada.
Esses são os valores que te incutimos, e pelos quais queremos que tu pautes a tua conduta.
Orgulho-me muito de ti Meu Filho.
 
 Foi então, que os braços dele se esticaram e me envolveram no melhor abraço do universo.
Selou aquele momento com um beijo. 

 Sabes Diogo, tens razão se nos tivesses dito o motivo, acho que não ia-mos entender.
Mas agora vendo a verdade e o que te levou a mentir, ensina-nos a ter-mos mais sensibilidade para pormenores que por vezes nós adultos não valorizamos.
Acabaste por nos dar, uma boa e grande lição Filho.
Vai vestir o pijama lavar os dentinhos e vai-te deitar.
 
 Agradeci-lhes, fui cumprir esse ritual, e meti-me na cama.
Só faltava a ronda das despedidas.
Virem dar-me um beijinho.
Agora, na minha cama, estava aconchegado nos cobertores, e agarrado como sempre a minha Mantinha.
Sobra uma boa história, para lhe contar!

 

 

DIOGO MAR



1 comentário:

  1. Um texto que sempre gosto de ler quando se mergulha numa linda infância, recheada de valores e que vão marcando a nossa história, onde nela aparece como personagem um Diogo bom de <3 Parabéns !!!

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