Olá, quem não se lembra das pastilhas
elásticas Gorila!
Eu aproveitava todos os trocos e gorjas,
que tinha como recompensa dos recados que fazia a algumas velhotas, da minha
aldeia, Para comprar as chiclas da Gorila.
Era dois em um. Já que além da pastilha,
ela fazia-se acompanhar de um cromo para juntar a nossa coleção.
Este investimento saciava dois desejos.
Sempre que ia a loja do Sr., António com
algumas moedas a reluzirem na minha mão, ele já sabia.
Quantas são Diogo?
Deixava-as cair no balcão e juntos
conferia-mos, para ver quantas dava.
Por vezes até faltavam uns testões, mas o
Sr. António que não era somítico, acabava por me presentear com mais uma.
Aquela atitude era como me fidelizar-me a
sua loja.
Tinha uma figura pitoresca, de estatura
média, magro e com um longo e farfalhudo bigode, semblante sorridente e sempre
por companhia o seu lápis por de traz da orelha.
Sentia que gostava de mim, só não achava
muita piada a algumas das traquinices que por vezes fazia em conjunto com os
outros.
Ainda recordo a célebre frase que as
pessoas mais velhas da minha aldeia diziam.
Raios parta a canalha,
Nem o diabo quis conversa com ela.
Eu não achava piada a frase porque
se o diabo é tão mau,
Então estavam a dizer que nós ainda eramos
piores.
Mas ao mesmo tempo também lhe dava outra
interpretação.
Se nós conseguíamos ser piores que o
diabo, que é mau, ainda somos mais fortes, era-mos uns heróis!
Com as Gorilas no bolso eu era um rei.
Os meus amigos acercavam-se de mim na
ânsia que eu lhes oferecesse uma chicla.
O Daniel o Rafa o Rodrigo o André quase
que em uníssono uns com voz mais audível outros mais tímida, pediam-me.
Ó, Diogo podias dar-me uma chicla.
Dás-me Diogo? Anda lá!
Eu acedia ao pedido, mas com uma
condição.
O cromo, é meu.
A quem eu oferecia em primeiro, era ao
Rodrigo, pelos laços familiares que nos une.
É afilhado dos meus Pais.
Agregado a isso, era o mais tímido e nem
pedia.
E como fui educado a não pedir nada aos meus
pais, sabendo eu que dessa forma lhes despertava uma maior vontade de me
presentear,
Achava a postura do Ródri, era assim que o
tratava, a mais correta.
Era como um irmão que eu não tinha.
Por vezes até nem lhe dava na frente dos
outros, para eles não repararem na minha dualidade de critérios.
Mas o Rodrigo sabia que eu tinha sempre a
pastilha para ele, com a vantagem, dava-lhe o cromo se ele já fosse repetido.
Lembro uma vez, que fui chamado a pressa
pela minha mãe.
Corri para casa e acabei por me esquecer
de dar a chicla ao Rodrigo.
Durante o jantar, assaltou-me à ideia o
meu esquecimento.
Mergulhei numa grande tristeza pela minha
falha.
Arranjei uma boa mentira, para os meus
Pais me deixarem ir a casa dele, com o pretexto de um trabalho de turma, que estava-mos
a fazer na escola, mas que tinha-mos de dar continuidade em casa.
A minha Mãe disse-me logo que não, faltava
o veredito final do meu Pai.
Vais, mas quero-te aqui em casa
dentro de 15 minutos.
Respirei de alívio, era tempo mais
que suficiente para dar uma fugida a casa do Ródri, e emendar o meu erro.
Saí porta fora a correr.
Saí porta fora a correr.
Toquei a campainha.
Vinha lá de dentro um turbilhão de vozes
alteradas, com linguagem vernácula.
Era mais um episódio de discussão, que
infelizmente marcavam e traumatizavam a vida do Rodri.
Fiquei algo assustado.
O Pai do Ródri não ia lá muito com a minha
cara, porque eu era muito frontal e rebatia as ideias ditatoriais dele.
Bom, eis que alguém abre a porta, estava
algo receoso, mas era o Rodrigo.
O que queres Diogo?
Senti que estava magoado comigo.
Pedi-lhe desculpa e estiquei-lhe a mão e entreguei-lhe a gorila.
Pedi-lhe desculpa e estiquei-lhe a mão e entreguei-lhe a gorila.
Instantaneamente o semblante carregado,
deu lugar a uns olhos rasos de lágrimas.
Agradeceu-me com a voz trémula.
Não tinhas necessidade de vires cá.
Muito obrigado, és um grande amigo Diogo.
Nunca tive dúvidas disso.
A, e desculpa a maneira como te falei
quando te abri a porta.
Como já deves ter dado conta as coisas
aqui por casa não estão fáceis.
Sim, já deu para ver.
Um dia, vais ter tudo que mereces.
Se a gorila ajudar a ficares um pouco mais
feliz, já fico contente.
Não, Diogo. A chicla não me vai por
feliz.
Mas o teu gesto a tua atitude, essa sim
encheu o meu coração de felicidade.
Ainda bem Rodrigo.
Boa noite.
Mais uma vez obrigado Diogo és um amigão.
Amanhã dou-te o cromo.
Não, é para ti.
E se te faltar?
Ródri, não é um cromo que paga a
felicidade de um amigo.
Tchau, fica bem.
Corri para casa, já que o tempo que me
tinha sido concedido, estava-se a esgotar.
Chegado encontrei o meu pai a ler, e a
minha mãe a preparar as roupas para o dia seguinte.
Olharam-me e a minha mãe, fez o
comentário.
Então Diogo o trabalho, já tiraste
as dúvidas com o Rodrigo?
Sim mãe, já.
Diogo, sabes que nós não gostamos
que tu mintas, e os teus olhos facilmente te denunciam.
O que foste lá fazer Diogo?
Questionou-me o meu Pai, com voz
firme.
Senti-me confrangido.
Senti-me confrangido.
Não tinha medo aos meus Pais, nunca foram
esses os padrões de educação que me ministraram.
Respeito sim, medo não.
Eu sabia que era quase impossível enganar,
e muito menos mentir a minha Mãe.
Fiquei imóvel e em silêncio, durante uns
segundos.
Lá respondi:
Sim, eu efetivamente menti.
Não há trabalho nenhum, eu fui dar ao
Rodrigo uma pastilha elástica que lhe tinha prometido hoje a tarde.
Já que não o fiz, quando estava junto
dele, porque vim a correr a quando da chamada da Mãe.
Sim, Diogo e porque não disseste a
verdade?
Retorquiu-me o meu Pai.
Tive receio que por ser algo tão banal vocês não me deixassem ir.
Tive receio que por ser algo tão banal vocês não me deixassem ir.
Gosto de cumprir com a minha palavra e com
as minhas promessas.
O Rodrigo, é um caso duplamente especial,
já que como vocês sabem é o meu melhor amigo, além dos laços familiares que nos
liga, nunca me pede nada, e tem a conjuntura familiar que infelizmente todos
sabemos.
Daí este meu empenho em nunca falhar com
ele, porque sei que o magou-o, e dessa forma estou, a contribuir para a sua
tristeza e para o seu sofrimento.
Mas reconheço o meu erro em vos ter
mentido.
Só me resta pedir-vos desculpa.
As lágrimas, lavavam-me a cara.
De pé, encostado a parede, olhava os meus
Pais, com o respeito que me merecem.
Sentia-me um ator, só e abandonado no
palco.
Eis que uma mão me puxa para um colo que
bem conhecia.
O mais terno e doce colo do mundo. O da
minha mãe.
Abraçou-me contra ela, limpou-me as
lágrimas com a ponta do avental, e cobriu-me de beijos.
O meu Pai desviava o olhar para a
televisão para eu não me aperceber de alguma lágrima atrevida que lhe
escapasse, mas eu bem que o conhecia.
Ele era o meu Pai, mas acima de tudo o meu
melhor amigo.
Sei do coração de ouro que tem e do
orgulho, que sente por mim.
Eu amo os meus Pais.
Depois de todo o afago da minha Mãe,
levantei-me e fui pedir desculpa ao meu Pai.
Ele fitou-me fixamente, com um olhar
ternurento, disse-me.
Diogo, sabes que não gostamos de
mentiras, mas o teu ato foi tão nobre, em honrares a tua palavra, com o intuito
de Acarinhares o teu melhor amigo, que só por si a falha para connosco está
perdoada.
Esses são os valores que te incutimos, e
pelos quais queremos que tu pautes a tua conduta.
Orgulho-me muito de ti Meu Filho.
Foi então, que os braços dele se
esticaram e me envolveram no melhor abraço do universo.
Selou aquele momento com um beijo.
Sabes Diogo, tens razão se nos
tivesses dito o motivo, acho que não ia-mos entender.
Mas agora vendo a verdade e o que te levou
a mentir, ensina-nos a ter-mos mais sensibilidade para pormenores que por vezes
nós adultos não valorizamos.
Acabaste por nos dar, uma boa e grande
lição Filho.
Vai vestir o pijama lavar os dentinhos e
vai-te deitar.
Agradeci-lhes, fui cumprir esse
ritual, e meti-me na cama.
Só faltava a ronda das despedidas.
Virem dar-me um beijinho.
Agora, na minha cama, estava aconchegado
nos cobertores, e agarrado como sempre a minha Mantinha.
Sobra uma boa história, para lhe contar!
DIOGO MAR
Um texto que sempre gosto de ler quando se mergulha numa linda infância, recheada de valores e que vão marcando a nossa história, onde nela aparece como personagem um Diogo bom de <3 Parabéns !!!
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