sábado, 3 de janeiro de 2015

VIVÊNCIAS DA MINHA ALDEIA HISTÓRIA_11



 
Estava eu pelos meus 14 anos, idade essa que se permite ter todos os sonhos e fantasias.

Depois crescemos, e constatamos que não é bem como nós alicerçamos os nossos projetos.
Como de um quadro se tratasse, que pintávamos com tons vivos e coloridos, mas com o decorrer do tempo, ia adquirindo alguns sombreados.
Eram as fintas e rasteiras da nossa vivência.
Processo por vezes doloroso, mas que nos faz amadurecer.
estávamos na fasquia entre os 12 e os 15 anos.
Ou seja: os mais novos do grupo eram o Rodrigo e o Daniel
Pelo meio estava eu e o André
O mais velho era o Rafael.
Olhando a proximidade das nossas idades, padecíamos dos mesmos problemas e ânsias, da adolescência.
Acalentávamos um futuro desenhado e projetado por nós.
Que idade tão bonita.
Idade de saborear todas as travessuras, e sentirmo-nos os verdadeiros campeões os donos do mundo.
Tempo das primeiras namoradas, dos amores inocentes, como se de um filme se tratasse, onde desempenhávamos o papel de atores principais.
Ainda não se tinham banalizado, princípios morais e éticos.
Os patamares da vida tinham outro encanto.
A par de tudo isto, os nossos Pais iam-nos incutindo o sentido de responsabilidade, através das tarefas pelas quais nos incumbiam.

Felizmente que não éramos embriagados pelo facilitismo irresponsável agora reinante.

Claro está que os padrões de educação eram algo diferentes, os melhores que os nossos progenitores achavam para nós.
Como pássaros livres, nós também vivíamos em perfeita harmonia com a natureza.
Sabíamos respeitá-la, mesmo porque tínhamos a consciência que dela dependíamos.
O amanho da terra, as sementeiras, as colheitas o cuidar dos animais.
Tudo isto eram tarefas às quais dedicávamos parte do nosso tempo.
Era um orgulho ver os campos asseados, eram os jardins da nossa aldeia.
Os animais bem tratados, transpirando saúde.
Eles a seu tempo iam entrar na nossa cadeia alimentar.
A lei justa da sobrevivência.
Embora eu tivesse alguma relutância quanto a isso, já que havia animais pelos cuais ganhava afeição.
E não aceitava muito bem a sua morte.
Principalmente os coelhos.
Isto já não se aplicava aos perus e as galinhas, que achava animais estúpidos e pasmacentos.
Sempre que se procedia à morte de animais lá em casa, ou na aldeia eu nunca ia assistir.
Os meus Pais respeitavam essa minha vontade, e nunca me forçavam a ver tal tarefa.
Os meus amigos gozavam comigo, e com o André que partilhava da mesma atitude.
Por alturas da matança do porco, a família do Rafael convidava-nos para esse ritual.


Então Diogo, não vens?


Espicaçava-me ele, num tom provocatório, sabendo da minha resposta.
Olha Rafa, vai dar uma volta, bem sabes que não.


Pois, mas depois gostas de comer os rojões! Lol.


Mas logo se apressou a dizer:


Estou na brincadeira contigo Diogo.
Nós sabemos bem que tu e o André não gostam de ver matar.


Não fosse eu levar aquele comentário asseriu, e rejeitar o convite.


Depois vão lá ter para o almoço ok?


Sim, depois eu e o André vamos la ter.
Rafael: Poço convidar o Rodrigo?


Sim, claro que sim, a questão é que o Pai dele deixe.


Sendo a pedido do meu Pai, ele não se atreve a negar.
O Armando era um personagem bastante problemático, já contava no seu curriculum com uma passagem pela cadeia.

O Rodrigo era afilhado dos meus Pais, pessoas a quem o Armando respeitava e temia.
Já que o meu Pai o reprendia pelos maus tratos que infligia à família.
Não admitia essa postura animalesca da parte do Pai do Rodrigo.

Pairava no horizonte a possibilidade dos meus Pais, requererem a guarda dele fazendo valer a posição de Padrinhos.
Situação que me agradava imenso, já que ganhava o irmão que não tinha.
O Armando, não nutria grande simpatia por mim, porque eu o afrontava, em defesa Do Rodrigo.
As suas ideias ditatoriais passavam-me ao lado, eu sabia rebatê-las.
Não tardou, e os gritos lancinantes do suíno ecoavam pela aldeia.
Eu punha o som da música mais alto para abafar aquele estridente ruido.
Depois dessa fase traumática para mim, já podia por pés ao caminho para ir chamar o Rodrigo.
Acompanhado pelo André lá fomos enfrentar aquela figura austera e rude que era o Armando.


O que querem?


Primeiro, bom dia.
Fica bem dizer-se.
Segundo, venho chamar o Rodrigo para ir almoçar connosco a casa do Rafael, estão lá todos, e os meus Pais fazem gosto que ele vá.


De forma grosseira, lá chamou o filho.
O Rodrigo acercou-se do portão.


Vais, mas não te quero aqui tarde.
Estás a ouvir pá?


Também não vamos comer apressadamente para ele vir para casa, é falta de educação sair da mesa antes que todos acabem de almoçar.
Bem como, não se vai a casa de ninguém só para comer e logo sair.
São regras de boa educação que os meus Pais me ensinaram, e claro está, também querem que o afilhado tenha.
Certo?

 

Isto não pode ser assim Diogo.


Bom, isso é um assunto que você deve falar com o meu Pai.
Ele enquanto está na nossa companhia está bem, ao contrário daquilo que você acha.
Há, e está feliz.
O Rodrigo tal como eu e todos, tem direito a felicidade.
Não acha?


Bom, vamos ficar por aqui, respondeu o Pai do Rodri já com um semblante carregado.


Senti que tinha vontade de descarregar a sua fúria em cima de mim, mas nem se atrevia a tal.
O Rodrigo, dava-me toques, em sinal para eu me calar, tendo receio, que eu ao entrar em despique com o Pai, hipotecasse a ida dele ao almoço.
Mas eu, que sempre fui e sou de fortes convicções, não me deixava amedrontar, pelo tom ríspido e intimidatório do Armando.
Para mim, antes quebrar que torcer.
Com a minha razão ninguém me cala.
Dobramos a esquina da rua, e o Rodrigo logo esboçou um sorriso que lhe inundou o rosto, contrastando com o azulado dos seus olhos.
Parecia ter ganho um uma nova vida.
Era sempre assim, quando eu o arrancava de casa.


Obrigado Diogo, só tu para me libertares.


Para mim, não há nada que pague a felicidade de alguém de que gostamos muito.
Era esse o caso, o Rodri era um irmão.
Agora já em casa do Rafa, com um forte cheiro a rojões e a sarrabulho, e com toda aquela gente, vivia-se um ambiente de alegria pura, e contagiante.
Deram-nos as boas vindas, e ficaram felizes ao verem o Rodrigo.


Ó meu amor, tu vieste!

Que bom!

 

Arrancou um enorme beijo da Zulmirinha e da minha Mãe e Madrinha, que ele adora.

O Avô do André, levou um acordeão, o meu Pai pegou no cavaquinho, o Pai do Rafael nos ferrinhos.
Estava montado o cenário para uma tarde de convívio, que cada escalão etário aproveitava da melhor forma.
Foi festa rija até a noite.
Bem a moda do Alto-Douro.

 

 

DIOGO_MAR

3 comentários:

  1. Por mais tempo que passe são estas memórias que nos acompanham sempre

    Beijinhos*

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  2. Olá Diogo, vim retribuir sua visita ao meu blog e encontrei esse texto com tantas memórias bonitas, eu tenho saudades da inocência dos meus 12 anos que foi uma das melhores fases da minha vida.
    Gostei da sua franqueza e sua escrita. Um abraço e volte sempre ao meu cantinho o/

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  3. Episódios de infância... que fazem parte da nossa história passada... e que dão para contar tantas histórias... e lições de vida...
    Fantástico o texto, Diogo!
    Gosto deste género de escrita... franca, directa, simples e desenpoeirada, onde só o essencial, e o que interessa, é que fica mesmo dito.
    Para continuar!... Bom trabalho!
    Um abraço
    Ana

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